quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

              O CACHORRO DO DHOMINI



Como é bom esse BBB. Bom porque nos permite a autocrítica enquanto povo, afinal as pessoas que ali estão não vieram de Marte, são daqui mesmo. É uma chance de nos debruçarmos sobre a questão de como melhorar o que somos.
Embora os participantes não espelhem todo o universo brasileiro, temos que admitir que boa parte dele está representado. Não fosse assim, não seria o sucesso de audiência que é há treze anos. Os números não mentem!
Em um recente episódio, Dhomini, ex-vencedor do programa, contou com naturalidade que arrancou todos os dentes de um cachorro com um machado, como se isso fosse uma reação aceitável diante de uma mordida na perna. Ele é uma exceção, mas uma exceção como as muitas que existem no nosso universo. Dhomini não veio de Marte, pelo menos até onde eu sei.
Graças ao BBB temos a chance de discutir esse assunto.
A lei ambiental 9605/98 apena esse tipo de conduta com três meses a um ano de detenção, ou seja, se você quiser fazer o mesmo é só estar disposto a pagar uma cesta básica ou coisa que o valha. Evidentemente há aqui uma distorção, e não é porque o direito ainda tem como fundamento o antropocentrismo, isto é, o homem no centro de tudo, já que a declaração causou horror a nós mesmos, os homens, mas pela resposta fraca a esse tipo de comportamento inaceitável e que causou tanta revolta. O tamanho da reprimenda precisa ser revisto. Mas ainda não é este o ponto.
Embora o filósofo Norberto Bobbio tenha intuído um caminho na direção dos animais como sujeitos de direito no célebre artigo ”Direitos do Homem e Sociedade”, ainda não chegamos a esse estágio evolutivo e então temos que obter uma solução que nos leve à melhoria do sistema jurídico na defesa deles, uma vez que o que existe parece ser insuficiente.
Na verdade não sabemos se a crueldade realmente aconteceu, o que nos interessa aqui é que o sujeito em questão, herói do povo (pelo menos era), contou em cadeia nacional a história como se fosse um exemplo de conduta correta agir quase irracionalmente para responder ao cão na base do olho por olho, dente por dente. 
De qualquer modo a conduta de mencionar uma história destas em cadeia nacional sequer é prevista adequadamente pelo legislador. Aí está a principal falha.
O artigo 287 do Código Penal que prevê que é crime a apologia a fato criminoso também não é a resposta já que a punição é pífia, três a seis meses de detenção, e refere-se a fatos acontecidos.
É por isso que proponho a criação de um novo artigo na lei ambiental: “Apologia à crueldade contra os animais”, porque o acontecido nos revelou uma lacuna do Direito que precisa ser preenchida, sob pena de comportamentos como este ficarem sem resposta adequada. E o caso é para a resposta mais forte: O Direito Penal. 
Porque não um novo artigo na lei 9605/98 que proibisse o estímulo à crueldade contra os animais? A indignação popular nos aponta um caminho, o de que estes casos devem ter tratamento especial, e a lei pode e deve ser propositiva, estabelecer um plano para a evolução social. A proibição desta conduta atinge em cheio este objetivo.
As entidades de defesa dos animais, das quais me considero membro honorário, podiam comprar esta briga fácil de ganhar já que o BBB nos deixou de frente para o gol.

                                                                       Fábio Scliar
                                                 Professor Universitário e Delegado Federal